Por Fernanda Macedo
Investidores e seus trilhões sob gestão são a alavanca perfeita para impulsionar mudanças econômicas em grande escala no planeta. Um bom exemplo disso é a reviravolta no portfólio de investimento do Rockefeller Brothers Fund, ao anunciar em 2015 que deixaria de investir no mercado de petróleo e carvão e passaria a apostar na economia verde. A família Rockefeller – cuja fortuna foi construída com base no petróleo – faz parte de um movimento global de investidores interessados em descarbonizar a economia, como estratégia de reduzir os riscos de seus investimentos a médio e longo prazo.
Na COP 21 (veja mais sobre o funcionamento dos organismos multilaterais aqui), foi possível observar que o Rockefeller não estava sozinho. Mais de 500 instituições possuidoras de US$ 3,4 trilhões em ativos assumiram compromissos para ações de desinvestimento, ou seja, retirar a aplicação de seu capital de empresas e atividades econômicas intensivas em carbono (leia mais sobre o papel das empresas aqui).
Os resultados dessa campanha, coordenada pelas organizações 350.org e Divest-Invest, são um forte indicador da importância que esses investidores têm atribuído à mudança climática. E representam também uma tentativa de pressionar os governos a fazerem o mesmo (mais sobre o papel dos governos aqui), incentivando políticas de estímulo a soluções de baixa intensidade em carbono, e extinguir subsídios aos combustíveis fósseis em seus países.
Os chamados Investimentos Sustentáveis e Responsáveis (ISR, ou SRI, na sigla em inglês) cresceram de forma acelerada nos últimos anos. De acordo com a pesquisa Global Sustainable Investment Review, investimentos realizados com critérios de sustentabilidade, entre eles o de baixo carbono, chegaram a representar US$ 21,4 trilhões, ou 30,2% do total de ativos geridos nos mercados da Europa, Estados Unidos, Canadá, Ásia, Japão, Austrália e África, em 2014.
A iniciativa dos Princípios para o Investimento Responsável (PRI), que reúne investidores que possuem estratégias de ISR, tem crescido em números de signatários desde o seu surgimento em 2006, chegando hoje a cerca de 1.400 membros com mais de US$ 60 trilhões sob gestão.
Outra iniciativa, esta mais voltada especificamente para a questão da mudança do clima, o Carbon Disclosure Project (CDP), reúne mais de 827 investidores institucionais representantes de US$ 100 trilhões em ativos interessados em ter acesso a uma fonte global de informações sobre as estratégias e a gestão de riscos das alterações climáticas pelas empresas.
Para atender a demanda de informações de investidores como esses, a Bloomberg disponibiliza uma plataforma de dados ambientais, sociais e de governança que permite avaliar os riscos e oportunidades associados aos investimentos. São cerca de 120 indicadores de 5 mil empresas de capital aberto no mundo todo.
Além do papel dos agregadores de dados, como a Bloomberg, as bolsas de valores começaram a buscar formas de atender os investidores do ISR com produtos financeiros específicos para o mercado de ISR. É o caso dos índices de sustentabilidade em bolsas de valores, como o Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE), criado no Brasil pela BM&FBovespa. Hoje, já são mais de 50 índices de sustentabilidade em bolsas de valores pelo mundo.
Esses índices têm o papel de fornecer aos investidores uma análise comparativa do desempenho das empresas listadas em bolsas sob o aspecto da sustentabilidade corporativa e identificar para investidores aquelas com práticas diferenciadas.
A BM&FBovespa, juntamente com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), criou também, em 2010, o Índice Carbono Eficiente (ICO2). Esse índice considera o grau de eficiência de emissões de gases de efeito estufa (GEE) de uma empresa ao ponderar as ações de seu portfólio. O principal objetivo é prover os investidores de um indicador voltado para a mudança do clima e, também, incentivar as empresas com papéis negociados na Bolsa a aferir, divulgar e monitorar suas emissões de GEE, visando ganhar atratividade entre os investidores à medida que sua geração de receita vincular-se menos às causas do aquecimento global. A lógica é simples: quanto mais o mundo caminha para longe das atividades intensivas em emissões de carbono, tanto mais promissoras se tornam as empresas cuja receita é menos dependente desse problema.
Para figurar em um índice como o ISE ou ICO2, as empresas devem primeiramente conhecer suas emissões de GEE e traçar um plano para gerenciá-las.
O método GHG Protocol, lançado nos Estados Unidos, em 1998, pelo World Resources Institute (WRI) e pelo World Business Council for Sustainable Development (WBCSD), auxilia empresas a entender, quantificar e gerenciar suas emissões e é hoje o método mais usado mundialmente por empresas e governos para a realização de inventários de GEE.
Dez anos depois, a iniciativa seria lançada no Brasil com o nome de Programa Brasileiro GHG Protocol, por meio de uma parceria entre FGVces e WRI, com o apoio do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS), da Embaixada Britânica no Brasil, do Ministério do Meio Ambiente (MMA) e de 27 empresas fundadoras.
Para que o inventário de emissões corporativas vá além de uma simples ferramenta interna de gestão, o Programa Brasileiro GHG Protocol criou também o Registro Público de Emissões, para auxiliar empresas a dar transparência às informações de seus inventários e, assim, sinalizar a investidores o quanto ela conhece e gerencia suas emissões (leia mais sobre ferramentas empresariais aqui).
Aumentar a transparência da governança corporativa sobre as emissões de GEE é visto como um intangível positivo pelos atores do mercado, segundo George Magalhães, gestor do Programa Brasileiro GHG Protocol, no FGVces. “Organizações que demonstram processos de gestão mais evoluídos tendem a ter maior capacidade de identificar e mitigar riscos, o que é um atrativo para os investidores que, naturalmente, buscam maximizar a relação risco-retorno de seus investimentos”, comenta.
Embora seja significativa a movimentação dos investidores que aderem a compromissos como a campanha de desinvestimento em fósseis, vale ponderar que há ainda uma grande distância entre a prática e o discurso. Um relatório divulgado pela Rainforest Action Network (RAN), BankTrack, Sierra Club e Oil Change International indica que o financiamento aos combustíveis fósseis pelos maiores bancos do mundo, desde o acordo climático de Paris, manteve-se e é ainda muito alto.
A transparência, não apenas das empresas e seus inventários corporativos, mas também dos investidores sobre seu portfólio, é a chave para descobrir se a descarbonização da economia realmente está acontecendo.