Geração após geração, o País não consegue avançar na solução de seus problemas sociais mais básicos. Como o S do ESG pode contribuir para mudar esse destino?
Por Magali Cabral _ Foto: Heather Zabriskie/ Unsplash
“Brasil, um país do futuro.” A imagem enunciada no ensaio do escritor austríaco Stefan Zweig, publicado simultaneamente em várias línguas, em 1941, parece ter cristalizado as mazelas sociais do País no passado. Oitenta anos depois do vaticínio de Zweig, as desigualdades não só permaneceram como se enraizaram. Nesse período, o Brasil tornou-se um dos países mais desiguais do planeta, com 49,6% de toda a sua renda nas mãos do grupo de brasileiros mais ricos, como apurou o Instituto Credit Suisse. Sim, também houve avanços. Mas, quando o país dá alguns passos à frente no campo da educação, da saúde, dos direitos humanos, das articulações de movimentos sociais, entre tantas outras causas, parece que uma força contrária é atraída para procrastinar o futuro desejado.
A crise econômica e a mal-administrada pandemia de Covid-19, somadas a um governo insensível aos problemas concretos da população, têm jogado uma lente sobre o S das práticas ESG. A que demandas da sociedade as organizações empresariais que aderiram a essa agenda podem tentar atender para minorar os problemas mais prementes? Antes de buscar essas respostas, é importante entender se é papel das empresas ir além do compliance e participar da busca de soluções para as desigualdades sociais do País, uma função tradicionalmente atribuída ao Estado.
Para o historiador Creomar de Souza, sócio da consultoria Dharma Political Risk and Strategy, grandes organizações têm menos capacidade do que um ente governativo tradicional para resolver isoladamente os problemas sociais que o País acumula. “Mas elas podem responder a muitas demandas de maneira rápida e, ao mesmo tempo, se alinhar a uma tendência mercadológica”, afirma. Para o consultor, a pandemia está provocando um choque de realidade profundo, pois traz uma percepção de vulnerabilidade social generalizada. “Momentos sensíveis como o atual podem ser indutores de boas práticas”, diz.
No ápice da pandemia, parte considerável da comunidade empresarial que não aceitou o discurso negacionista saiu em busca de contribuições para reduzir o impacto provocado pela crise sanitária. Souza destaca a iniciativa da empresária Luiza Trajano, do Magazine Luiza, de auxiliar o poder público a agilizar a aquisição e a distribuição de imunizantes contra a Covid-19. Várias outras grandes corporações uniram-se a ela. Ainda que sejam ações desvinculadas do negócio, para ele, essas movimentações que surgem em tempos de crise revelam o quão potencialmente forte é a capacidade das organizações empresariais ESG serem forças transformadoras.
Apesar do bom exemplo, para o fundador da Dharma, a tropicalização do conceito está atrasada em relação especialmente à Europa Ocidental e aos Estados Unidos, o que não chega a ser uma novidade, considerando o desenrolar lento de outras agendas internacionais no Brasil, como os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). “Creio que, como tudo que envolve essas novidades, o Brasil acaba sendo um tanto periférico, pois temos essa vocação para o retardo. Nesse sentido, a pauta é ainda incipiente e é nitidamente puxada por companhias multinacionais que recebem uma pressão das suas matrizes para assumirem posicionamentos ativos de responsabilização por pautas ambientais, sociais ou de governança.”
O presidente do Instituto Ethos, Caio Magri, acredita que para dar materialidade ao ESG será preciso, antes de mais nada, tropicalizá-lo, o que dependerá de aumentar os holofotes justamente sobre o eixo social, aquele que carrega os dados mais injustos do País.
Dados que o economista Ladislau Dowbor, professor titular da Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP), não deixa seus leitores e interlocutores esquecerem: “Temos hoje cerca de 19 milhões de brasileiros com fome e aproximadamente 116 mil pessoas em situação de insegurança alimentar – aqueles que ora têm, ora não têm o que comer. Dos 19 milhões com fome, 25% são crianças. É um crime sem tamanho, principalmente porque a quantidade de alimento produzida no País, se dividida igualmente entre toda a população, resultaria em mais de 4 quilos por dia por pessoa”, contabiliza Dowbor. “Nós chiávamos no passado por causa da exploração do trabalhador, mas o que conhecíamos do capitalismo produtivo funcionava melhor que o atual capitalismo extrativo”, arremata.
A pesquisa Desigualdade de Impactos Trabalhistas na Pandemia, recém-lançada pelo Centro de Políticas Sociais da Fundação Getulio Vargas (FGV Social), sob coordenação do economista Marcelo Neri, revela que a renda individual média do brasileiro, incluindo trabalhadores informais, desempregados e inativos, encontra-se hoje 9,4% abaixo dos patamares do final de 2019. O Índice de Gini saltou para 0,64 no segundo trimestre de 2021, batendo o recorde de toda a série histórica dessa métrica de desigualdade socioeconômica.
Arregaçar as mangas para enfrentar tamanha desigualdade já seria desafiador para governos sérios e bem capacitados, o que dirá para o setor privado. A coordenadora da organização filantrópica Iniciativa Brasil da Aliança pelo Clima e Uso da Terra (CLUA, na sigla em inglês), Daniela Lerda, vê o ESG ainda envolto em um mundo de ideias. “As empresas tentam encaixar no conceito de ESG as ações sociais que têm em andamento, o que não significa que estejam transformando a forma de fazerem as coisas”, diz.
A gestora é cética também em relação a uma possível disposição do setor privado em extrapolar as fronteiras de seu ambiente de negócios em prol da redução das desigualdades brasileiras. “Seria ótimo se isso acontecesse, mas, na maioria das vezes, quando o privado aparece é para defender seus próprios interesses. A empresa reporta ESG mas é representada por uma associação que compactua com projetos de flexibilização de regras, sejam trabalhistas, sejam ambientais, que trarão um impacto negativo para o conjunto da sociedade”, opina.
Antes de se posicionar sobre a participação da iniciativa privada em questões sociais do País, o sociólogo Gilson Schwartz, professor da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP), ressalva que é preciso tomar cuidado para não achar que uma empresa é o melhor critério para avaliação da qualidade dos direitos sociais. Dito isso, ele considera o S do ESG uma iniciativa importante, desde que a empresa não incorra em hipocrisia: seus indicadores sociais são ótimos, mas em uma sociedade que desconsidera direitos sociais.
“A inclusão de mulheres, negros ou pessoas com necessidades especiais na força de trabalho pode render um ótimo indicador de ESG. Porém, dentro de um contexto em que representantes da sociedade, governo e legislativo estão na prática eliminando direitos e precarizando as condições de trabalho. O Uber, por exemplo, poderá dizer que seu indicador S está excelente”, observa.
Contradições
Pois é nesse tipo de contradição apontada por Schwartz que Anna Lygia Costa Rego, professora de Economia Comportamental e Psicologia Experimental aplicada ao Direito na Fundação Getulio Vargas (FGV), vê a beleza de se trabalhar com ESG, cuja missão é exatamente desatar esses nós. Além das tentativas de flexibilização das regras trabalhistas tão duramente conquistadas, ela lembra que existe também o desafio de uma revolução digital em curso.
“Boa parte de empresas que inovam em sistemas tecnológicos, como nos serviços de entrega e de transporte individual com motoristas autônomos, chegou com um discurso que a princípio pareceu compatível com o ESG. Na prática, não era bem isso. Era o mito do empreendedorismo que substitui a relação de emprego por uma relação de autonomia/empreendedorismo, em que se partilham os benefícios do negócio, mas não os riscos”, explica a professora (leia aqui a íntegra da entrevista).
Nesse sentido, a economista defende que o walk the talk (fazer o que fala, em tradução livre) do ESG seria atuar na reversão desse processo de flexibilização das relações de trabalho. “O walk the talk no ESG significa abrir mão da recompensa imediata, até do lucro, para obter um benefício que não necessariamente virá para si. Temos uma dificuldade muito grande em lidar com o altruísmo, não no sentido romantizado do termo, mas de enxergar o benefício coletivo como um retorno econômico individual”, reflete Rego.
O desequilíbrio no andamento das pautas ESG no Brasil em relação a países desenvolvidos, sobretudo em relação ao S, para a professora da FGV, faz um certo sentido: “São pontos de partida totalmente distintos. Os países ricos partem de um patamar que lhes permite sofisticar a discussão da segurança social. No entanto, o fato de a nossa situação de escassez real e percebida ser muito maior no Brasil confere ao ESG tropical um poder transformador também muito maior”, diz.
Contradições na esfera das relações entre o público e o privado também precisam ser superadas para que os impactos positivos do ESG comecem a aparecer. É como pensa o cofundador e diretor da Fama Investimentos, Fabio Alperowitch. Grande parte dos empresários brasileiros, segundo ele, diz-se liberal na economia – quanto menos intervencionista for o Estado, melhor para o desenvolvimento. No entanto, quando se trata de resolver questões sociais, a tarefa é toda empurrada para o poder público.
“As empresas [que carregam o ‘selo’ ESG] precisam refletir que o papel delas na sociedade vai além da venda de produtos ou serviços”, afirma. Esse “ir além” significa, no mínimo, estar alinhado à mudança do capitalismo de shareholders, em que as empresas priorizam só o lucro dos acionistas, para um capitalismo de stakeholders, que leva em consideração os impactos da produção para todas as partes interessadas (por exemplo, funcionários, consumidores, clientes, comunidade local).
Sem essas transformações mais estruturais, será difícil transpor o ESG do discurso para a realidade. Para o fundador da Fama Investimentos, o país está “atrasadíssimo”, especialmente as empresas que geram muita externalidade negativa. “A adesão à agenda é discutida por uma elite, um número pequeno de empresas listadas em bolsa. Milhares de outras mal começaram a falar sobre o conceito. Enquanto isso, continuamos sendo um dos países mais desiguais do mundo e o segundo com mais acidentes de trabalho”, assinala.
Mas existe uma janela de oportunidade para fazer a pauta avançar. Alperowitch acredita que a geração Z, das pessoas nascidas entre 1995 e 2010, já está subindo a régua na cobrança de posicionamentos das empresas sobre as grandes questões da sociedade. Vinte anos atrás, posicionamentos sobre racismo, desmatamento ou corrupção nem sequer faziam parte das demandas da sociedade. “Naquele tempo, uma empresa omissa era uma empresa normal”, diz ele. “Hoje, uma empresa omissa é uma empresa com problemas”, completa.
Segundo o executivo, mesmo para os que só têm olhos para o retorno financeiro é fundamental que suas marcas corporativas estejam vinculadas a grandes causas, sejam sociais, sejam ambientais. “Já vemos várias empresas começando a falar de racismo, outras de desmatamento, outras de inclusão social. Acho que essa é uma necessidade cada vez maior, e quem não entrar nesse debate corre o risco de ser marginalizado enquanto marca e enquanto empresa”, adverte.
ESG na cadeia de valor
Se a decolagem da agenda está lenta no universo das grandes empresas, um desdobramento ainda mais complexo do ESG será levar esses mesmos compromissos às milhares de médias e pequenas empresas incluídas em cadeias de valor. Como afirma Gilson Schwartz, de nada adianta a empresa exibir indicadores maravilhosos se seus fornecedores não estiverem também integrados ao ESG. É a partir dessa capilarização que os impactos se farão notar.
“Mas é difícil imaginar que todo mundo fará isso espontaneamente, muito menos que as grandes corporações irão verificar as condições de trabalho de cada um de seus fornecedores, se eles mesmos não tiverem uma governança que torne seus processos decisórios mais visíveis aos seus clientes”, diz Schwartz (mais sobre governança nesta reportagem).
As métricas são a principal ferramenta para dar materialidade às ações ESG. Elas dificultam o greenwashing, geram comparabilidade, contabilizam riscos, entre outras vantagens. Para Anna Rego, apesar de muito importantes, nelas pode estar um dos entraves para que o ESG chegue às cadeias de valor. O problema, a seu ver, é que o desenvolvimento das métricas está totalmente voltado às grandes empresas listadas em bolsa de valores, portanto com um framework, ou um escopo, muito pesado.
“Quem fará o score das empresas que estão nas franjas do negócio?”, indaga. “Todo mundo precisa e pode ter seus impactos sociais relatados, não só as big corporations.” O ESG como métrica, como arcabouço, tem de ser de todos, cada estrutura com a sua régua. Anna Rego sugere métricas que considerem outros benefícios para pequenas e médias empresas relacionados, por exemplo, à fidelização de consumidores. “Elas não precisam de superprojetos. Apoiar a escolinha da esquina já é o suficiente para o cliente ter uma percepção diferente da empresa”, afirma.
Caio Magri também chama a atenção para a necessidade de o ESG chegar às cadeias produtivas, especialmente dos setores mais críticos da economia, como o agronegócio, que ocupa territórios imensos com operações altamente impactantes. “Além de intervenções tecnológicas e mecânicas nas áreas ocupadas, há um impacto crescente e insustentável nos recursos hídricos, uma situação crítica de expansão das áreas para a produção, sem falar em trabalho escravo, desmatamento ilegal, entre outros complicadores.”
O presidente do Ethos também considera fundamental a construção de plataformas com indicadores e métricas adequadas às pequenas e médias empresas das cadeias produtivas.
Força relativa
O sistema financeiro, como o grande indutor do ESG no Brasil e no mundo, está conseguindo subir a régua nas empresas? “Sim, mas talvez pudesse fazer bem mais, principalmente no campo social. Nós acreditamos que por meio do capital é possível mudar o mercado. Se os grandes investidores fizessem o que nós fazemos, nem estaríamos aqui discutindo essa pauta.” A resposta é de Fernanda Camargo, fundadora da Wright Capital, um family office (gestor do patrimônio de famílias que buscam transformação social) que aloca 1% do patrimônio dos clientes em fundos de investimentos para negócios de impacto social. Segundo ela, os retornos em negócios de impacto já se equiparam aos tradicionais, e o percentual investido só não é maior porque ainda faltam opções nesse mercado.
Para Alperowitch, da Fama, o setor financeiro até o momento enxerga somente a si próprio e ignora a sua cadeia de valor. Ele afirma que os bancos se gabam de serem amigos do clima, sendo que partem de uma posição vantajosa em relação ao setor produtivo: agências bancárias conseguem ser carbono neutro com facilidade, pois quase não emitem gases de efeito estufa. O problema é que continuam financiando combustíveis fósseis, carvão e outros setores controversos.
“Se o sistema financeiro quiser realmente ser amigo do clima, precisa olhar a carteira de clientes. O mesmo vale para questões sociais: não adianta o banco relatar a sua diversidade bacana, se os clientes que ele tem financiado vão na direção contrária”, diz Alperowitch.
Mesmo olhando mais para si mesmo, há no sistema financeiro uma desigualdade social interna para a qual ainda não houve respostas concretas. Creomar Souza lembra das pressões recentes acerca de desigualdades salariais internas. Ele acredita que essa discussão não amadureceu porque o País passa por um momento tão instável que coloca outras urgências no topo da lista.
“Enquanto na Europa a diferença salarial entre banqueiro e bancário vai sendo trabalhada, aqui estamos preocupados com o fato de o ovo ter se tornado o novo bife”, diz Souza. Ou seja, as crises econômicas, além de engrossarem a relação de problemas sociais, emperram o andamento de questões que já vinham sendo discutidas. De qualquer modo, o historiador parte da premissa de que o ESG não trará resultados expressivos imediatos. “Estamos falando de uma escala de uma década ou duas. Mas chegará o momento em que os bancos voltarão a ser cobrados por seus clientes.”
Por onde começar a transformação?
Diversidade nas empresas e educação financeira são indutores de mudança; entenda por quê
Estudo realizado pela consultoria de gestão estratégica McKinsey & Company estabelece um vínculo entre diversidade e performance financeira empresarial. “Maior proporção de mulheres e uma composição étnica e cultural mais variada na liderança das empresas resultam em performance financeira superior”, diz a pesquisa.
O motivo desse vínculo, segundo a professora da FGV Anna Rego, está na tese de que empresas são ecossistemas com muitos pontos de contato com aspectos evolutivos do comportamento humano. “Colaboradores com bagagens, processos cognitivos e experiências diferentes aumentam a capacidade de a empresa performar melhor em diferentes métricas.”
Como exemplo, ela cita a melhoria na improvisação de soluções não conhecidas, a adaptabilidade a situações não previstas, a capacidade de fazer análises com mais nuances sobre riscos e sobre diferentes cenários. “Além disso, quando se tem todo mundo representado na mesa, a chance de sair uma posição completamente invertida, do ponto de vista de aceitação social, é muito menor. Um ambiente com diversidade é muito mais seguro para a empresa”, afirma.
O banco digital Nubank, por exemplo, deu-se conta de que estava sendo omisso em relação ao racismo estrutural brasileiro ao ver a repercussão negativa de uma declaração da cofundadora da instituição, Cristina Junqueira. No ano passado, em entrevista ao programa Roda Viva, da TV Cultura, ela afirmou ter dificuldade de contratar executivos negros para posições de liderança por falta dos requisitos técnicos que julga necessários.
As redes sociais não perdoaram, e o banco publicou uma retratação, admitindo ter se acomodado com o progresso da instituição nos primeiros anos de vida. “O erro foi achar que as coisas vão se resolvendo sozinhas, sem esforços contínuos e investimentos da liderança”, diz a nota. No comunicado, o banco também se comprometeu a avançar com uma agenda de reparação histórica e de combate ao racismo estrutural. Para fazer isso, anunciou parceria com o Instituto Identidades do Brasil.
Creomar Souza vê no movimento de retratação e nos comprometimentos posteriores do Nubank um processo de azeitamento das engrenagens das empresas decorrente do ESG. Segundo ele, existem organizações mais aptas, cujas práticas afirmativas nascem dentro do próprio Conselho de Administração e que já estão conquistando merecidos ganhos reputacionais, como foi o caso do Magazine Luiza. Outras, mais anacrônicas, já começam a perceber a impossibilidade de sobreviver no mercado sem uma reflexão e uma mudança de cultura interna.
Na opinião de Anna Costa Rego, o episódio do Nubank acabou se transformando em um case positivo. Por mais que a declaração da cofundadora da instituição tenha sido infeliz, o Nubank continua o debate sobre aquela questão até hoje. “Quando uma organização põe o dedo na própria ferida, isto é, continua dialogando permanentemente sobre um problema dela mesma, em vez de abafá-lo, mostra uma atitude madura que não víamos há muito tempo.”
Além da retratação, a professora conta que houve a contratação de pessoas de perfis étnicos – existe uma diversidade muito grande nas equipes, não só racial, mas com várias outras características –, e muita reflexão sobre o que mais pode ser feito.
Educação financeira – A educação financeira deve ser uma bandeira em qualquer sistema de crédito. Quando se liberam inovações, como o open banking, o Pix e outras infraestruturas financeiras inclusivas, o que é positivo, é preciso garantir que nos dois lados do balcão estejam pessoas capacitadas para lidar responsavelmente com o crédito.
Embora a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) mantenha há muito anos uma pauta de educação financeira, o superendividamento das pessoas no Brasil bate recordes atrás de recordes. Segundo o Instituto de Defesa do Consumidor (Idec), o endividamento atingiu nos últimos meses pelo menos 30 milhões de brasileiros, com tendência de aumento em decorrência da pandemia e do desemprego. Como não há iniciativas fortes por partes dos bancos em relação à problemática, foi necessária a criação da Lei nº 14.181, em julho de 2021, obrigando as instituições financeiras a parar de exercer qualquer tipo de pressão para seduzir clientes.
Anna Rego lembra que o superendividamento vai além de uma questão meramente financeira que se liquida numa transação. Trata-se de uma situação de falência individual, uma declaração de que a pessoa está incapacitada de lidar com o cronograma de pagamentos que tem com credores. “Uma pessoa que chega a uma situação de incapacidade de organizar seu fluxo de pagamentos é alguém que está com muitos problemas, inclusive em outras searas. Vulnerável socialmente, em termos de saúde mental. Quando o sistema financeiro oferece os instrumentos, mas não apoia o indivíduo a lidar melhor com a dívida, talvez esteja oferecendo a sobremesa antes do jantar”, conclui.
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