Por Magali Cabral
Nesta seção você conhecerá com mais detalhes alguns processos, ferramentas e metodologias que podem ser usados em espaços de aprendizagem, em empresas etc. São abordagens já consagradas e todas com pelo menos dois objetivos comuns: melhorar as relações sociais e estimular o pensamento criativo.
Design Thinking
Origem ‒ O Design Thinking é oriundo do campo do Design, onde tradicionalmente atuam profissionais formados em escolas de Arquitetura e de Desenho Industrial. Dessas áreas costumam sair pessoas inovadoras, porque são treinadas para lidar com informações ambíguas, para prototipar e para colocar o ser humano sempre no centro de seus projetos (um engenheiro, por exemplo, põe no centro um objeto).
Segundo o professor da FGV-Eaesp Wilson Nobre, o Design ganhou projeção quando as empresas perceberam que os designers conseguiam inovar de forma radical. Eles desenvolveram metodologia e modelo mental para lidar com situações que não estão definidas, ou que não têm uma especificação clara. Esse modo de ser e pensar dos designers foi chamado de Design Thinking. “Se eu puder ensinar alunos e profissionais a pensar como um designer, as empresas onde eles estiverem se tornarão inovadoras.”
Aplicação ‒ Novos modelos de negócio, como Uber, Waze, Easy Taxi etc., são frutos de estratégias do Design. A Apple é uma empresa de Design, que, primeiramente, pesquisa o que as pessoas gostam, o que é bonito e o que é prático. A esses conceitos ela, então, insere no computador, e não o contrário.
Aplicação na área de formação – Trabalhar a perspectiva de fazer o design de um processo educativo (uma escola, um novo método, um curso) mais inovador, interativo e lúdico. Como o designer não necessariamente possui as competências das diversas disciplinas, professores estão sendo treinados em Design Thinking para desenvolver cursos inovadores.
Práticas comuns ao designer thinking
Colocar o ser humano no centro dos projetos;
Dialogar por imagens: o visual tem uma qualidade muito maior para troca de significados do que palavras;
Ser colaborativo: no Design Thinking tudo é feito em grupo. Para um projeto formam-se times ecléticos (com visões diversas sobre a mesma coisa);
Ser divergente/convergente: quando recebe a encomenda de um projeto, o primeiro passo é se afastar um pouco e tentar entender o que de fato as pessoas estão precisando. Não há preocupação em um primeiro momento em entregar resultado, mas em ampliar perspectivas. Isso é feito por meio de divergências ao que está sendo proposto. Feito isso, surgem novas perspectivas e é hora de convergir para as respostas;
Prototipar: todo o passo a passo de um designer é feito a partir da prototipação até convergir ao produto final que se tenta oferecer.
Thinking Environment
Origem: A abordagem baseou-se inicialmente nos estudos da professora e escritora americana Nancy Kline, que trata da forma como se desenvolviam os pensamentos das pessoas durante reuniões em grupo. Usando estudos de neurociência e psicologia, ela chegou à proposição de que na sociedade ocidental as pessoas têm muita dificuldade em deixar que os pensamentos fluam de maneira harmônica e proveitosa.
Objetivo: Criar ambientes propícios para que fluam bons pensamentos que contribuam para uma conversa produtiva e dirigida ao resultado.
Aplicação: Nancy Kline desenvolveu uma ferramenta – chamada 10 Passos – para ajudar na aplicação do Thinking Environment. Por exemplo, um dos passos, o da igualdade, assume que as pessoas têm o mesmo direito a fazer uso da palavra, o que melhora muito a possibilidade de todos poderem contribuir na conversa. É comum, principalmente na sociedade latina, algumas pessoas mais eloquentes monopolizarem a conversa e, com isso, subtrair do outro a possibilidade de também trazer uma contribuição. “A pessoa que também quer falar fica esperando uma brecha e, enquanto isso, deixa de acompanhar o pensamento do outro”, explica Nobre. “Vira uma reunião de vários monólogos.”
Outro passo, o da apreciação, ensina que, quando se consegue fazer uma apreciação sincera ao outro, cria-se um forte vínculo social que derruba algumas das barreiras de medo das relações sociais. A pessoa se sente mais à vontade, perde a inibição e deixa de se proteger do outro que eventualmente poderia interpretá-la de maneira inadequada.
Os demais passos são perguntas instigantes (pode fazer a diferença na reunião), atenção (a qualidade da atenção do ouvinte e seu interesse genuíno naquilo que ouve determinam a qualidade do pensamento de quem fala), calma (a calma cria; a urgência destrói), encorajamento, sentimentos, informação, diversidade e localização.
Para obter mais detalhes sobre os 10 Passos, acesse aqui.
World Café
Abordagem de conversação em grupo que se propõe a estimular a criatividade das pessoas por meio da interação e, com isso, trazer inteligência coletiva à tona.
Origem: O método foi criado por Juanita Brown e David Isaacs e aplicado pela primeira vez em 1995, na Califórnia (EUA). Isaacs é presidente e Brown é conselheira da Clearing Communications, uma empresa de estratégia organizacional e de comunicações.
Para o autor do livro Educação Fora da Caixa, Alex Bretas, uma das premissas básicas do World Café é que todos trazem conhecimento para compartilhar.
“Cada um traz consigo seu leque de histórias, perspectivas, sonhos, ideias e sabedorias. Nesse sentido, o Café torna possível quebrar a lógica broadcasting do ‘um para muitos’ (caso das palestras e das salas de aula tradicionais) e enfatizar a visão sistêmica, por meio de conversas baseadas na horizontalidade e na colaboração.”
Prática: As 7 principais recomendações para a montagem de um World Café:
Definir o motivo da reunião e o resultado que se espera alcançar. Com base nisso, escolher as pessoas que devem ser parte da conversa e, só então, o tema e as perguntas;
Criar um ambiente acolhedor. Os participantes precisam sentir-se confortáveis e autoconfiantes para apresentar e ouvir ideias de um modo criativo. Em geral, a disposição é de grupos de quatro ou cinco pessoas em mesas-redondas no estilo de um Café. Todos devem ser encorajados a escrever, desenhar e rabiscar as ideias em cartolinas, post-its ou nas próprias toalhas de mesa;
É fundamental elaborar perguntas que estimulem os participantes a se engajarem em conversas significativas. Dessas respostas é que surge o conhecimento. Dependendo dos objetivos do encontro e do tempo disponível, explorar uma única pergunta pode ser suficiente. O mais importante é que as perguntas sejam relevantes em relação à preocupação do grupo.
Estimular a contribuição de todos em rodadas de conversa de 20 a 30 minutos. Mais do que participar, é importante acolher aqueles que querem contribuir ativamente com ideias e perspectivas. Basta ouvi-los.
Possibilitar a circulação entre as mesas para haver contato entre as pessoas. Uma das características do World Café é a chamada “polinização cruzada”, em que as pessoas trocam de mesa, fazendo uma conexão entre as ideias.
A qualidade da escuta talvez seja o fator mais importante para determinar o sucesso de um Café.
Na última etapa, chamada de “colheita”, o grupo reúne-se em um grande círculo para tentar tornar “visível” o todo das discussões. Antes, porém, alguns minutos devem ser destinados a uma reflexão silenciosa sobre padrões, temas e questões mais profundas experimentadas nas conversas em grupo a serem compartilhadas com o grupo maior. Aos anfitriões, recomenda-se que disponham de um método de “capturar essa colheita” ‒ trabalhar com registros gráficos é o mais indicado.
Aplicação: Para Alex Bretas, o potencial de engajamento de um World Café é enorme. “À medida que os participantes trocam de mesa, é como se a distância entre eles diminuísse. Funciona como uma metáfora de nossas conversas cotidianas, que se cruzam formando redes de interação em escalas cada vez maiores. Não utilize o World Café se sua intenção for ‘transmitir’ conhecimento ao grupo. Nesse caso, recorra a uma palestra ou a uma aula”.
Open Space
O Open Space Technology, ou Tecnologia do Espaço Aberto, é um formato criativo de reuniões em que qualquer coletivo pode se auto-organizar para interagir em torno de um tema ‒ é ótimo para tratar de assuntos urgentes e complexos que despertem a diversidade de pontos de vista.
Origem: O consultor organizacional Harrison Owen desenvolveu essa metodologia em meados dos anos 1980 ao perceber que, nos simpósios em formato tradicional (com apresentação de papers, painéis etc.) que costumava organizar, os momentos mais criativos aconteciam nas rodas formadas no coffee break.
Ele refletiu: “A sabedoria moderna está ofuscando algo que já sabíamos e já experimentávamos desde o início dos tempos. Uma das mais antigas práticas do Homo sapiens era a roda de conversa em torno da fogueira sem nenhuma coordenação central”.
O simpósio seguinte já foi totalmente diferente. Ele aboliu as agendas, os comitês de planejamento, as comissões de gestão etc. Tudo que os participantes precisavam saber era o tema, data e horário do início e previsão de conclusão dos trabalhos. Owen sentou-se com os 85 participantes formando um círculo e, para espanto de todos, 2h30 depois, a agenda – organização de uma oficina de três dias – estava totalmente planejada nos menores detalhes.
O segredo, segundo Alex Bretas, está na própria simplicidade. “Ao eliminar as regras impostas e abrir espaço para o que emerge do grupo, o método ajuda a tornar visível a complexidade das organizações.”
Um Open Space sempre deve ter um tema central de interesse de todos os participantes, geralmente orientado para uma ação (um novo projeto, por exemplo). Depois de reunidos em círculo é que a pauta é criada. Diversas conversas ocorrem simultaneamente e podem tratar de assuntos distintos, desde que mantendo uma conexão com o tema proposto.
O Open Space é guiado por quatro princípios:
As pessoas que vierem são as pessoas certas ‒ abra mão da expectativa em relação a quem deve vir à reunião.
A hora que começar é a hora certa para começar ‒ abra mão das expectativas quanto ao horário de início das sessões, pois as coisas acontecem quando estão prontas para acontecer.
O que acontecer é a única coisa que poderia ter acontecido ‒ abra mão da expectativa sobre como as interações devem acontecer e para onde a conversa deve fluir.
Quando acabar, acabou: abra mão da expectativa sobre quando deve terminar uma conversa. Se terminar antes é porque tudo já foi tratado; caso a interação se estenda, talvez seja realmente necessário.
Lei dos 2 pés: O Open Space é regido pela chamada “lei dos 2 pés”, que reforça a responsabilidade de cada um para com seu próprio aprendizado e abre a roda para quem quiser se movimentar. “A ideia é que as pessoas participem do que realmente têm vontade, podendo sair de uma conversa sempre que entenderem que não estão fazendo a diferença ali”, explica Bretas.
Essa movimentação permite a figura das “abelhas” ‒ participantes que levam informações de um grupo a outro ‒ e das “borboletas”, que optam por não participar de nenhum grupo. “Às vezes, o encontro entre duas ou mais borboletas pode acabar inaugurando uma nova conversa”, afirma. Um Open Space pode durar duas horas ou vários dias.
Pedagogia da Cooperação
Enquanto a sociedade segue privilegiando uma lógica competitiva, a Pedagogia da Cooperação vem propor processos de ensino orientados por culturas mais colaborativas. A abordagem facilita a solução de conflitos e o alcance de objetivos de maneira sustentável e agradável e pode ser aplicada em empresas, escolas, governos, comunidades, ONGs, famílias etc.
Das virtudes que permeiam a Pedagogia da Cooperação, a facilitadora de processos de aprendizagem e colaboradora da Escola Schumacher Brasil e do Instituto Singularidades, Denise Curi, destaca quatro: o desapego (somos todos mestres e aprendizes), a integridade, a plena atenção e a abertura para compartilhar.
Origem: O método começou a ser aplicado no Brasil na década de 1990, na área de educação física. Alguns educadores, entre eles Fábio Brotto, buscavam transformar a postura competitiva, geralmente associada às práticas esportivas, e promover uma nova maneira de jogar. Para eles, jogos cooperativos apresentavam uma estrutura alternativa, em que os participantes jogam com – e não contra – os outros.
Os pilares que sustentam a Pedagogia da Cooperação, segundo Denise Curi, podem ser resumidos em:
- Princípios: da “Co-Existência” – a compreensão de que somos interdependentes; da “Com-Vivência” – o reconhecimento do outro; da Cooperação – a confiança e o respeito mútuo; e o da “Comum-Unidade” – o ambiente para cultivar o espírito de grupo.
- Procedimentos: indicam um jeito de fazer. Por exemplo, os encontros acontecem em círculo (num círculo todos se vêm e somos todos iguais) e todo círculo tem um centro (que representa o que é essencial para o grupo e, ao mesmo tempo, nos lembra da existência de algo comum entre nós); começar sempre do mais simples para o mais complexo; ser mestre e aprendiz; começar e terminar juntos; utilizar a “ensinagem” cooperativa.
- Processos: as metodologias colaborativas empregadas, por exemplo Jogos Cooperativos; Danças Circulares, o Diálogo, o World Café, o Open Space, entre outros.
- Sete Práticas: Fazer “Com-Tato” – promover a integração, aproximação, reunir as pessoas para começarem juntas e se reconhecerem; Estabelecer “Com-Trato” – estabelecer acordos de cooperação e de “Com-Vivência”; Compartilhar “In-quieta-ações” – compartilhar perguntas, dúvidas, incertezas sobre o tema; Fortalecer alianças e parcerias – estimular as habilidades de relacionamento colaborativo, desenvolvendo a autonomia, a parceria, a confiança, o respeito mútuo; Reunir soluções “Como-uns” – fazer a colheita de todas as ideias, sugestões, dicas, insights, mantendo um ambiente de livre circulação, sem julgamentos; Projetos de Cooperação – transferir para o dia a dia a prática das soluções encontradas; Celebrar o “VenSer” – reconhecer e Celebrar cada passo da caminhada, das aprendizagens individuais e em grupo que foram conseguidas.
Teatro Social da Presença
Origem: O método surgiu há cerca de dez anos quando Otto Scharmer, o criador da Teoria U, conheceu a educadora e bailarina com tradição budista Arawana Hayashi. Scharmer sentia falta da comunicação por expressão corporal em sua Teoria U. Assim, Hayashi aportou todos os seus estudos sobre linguagem corporal à pesquisa do grupo do Massachusetts Institute of Technology (MIT). O curso de Teoria U traz uma série de quatro práticas – relacionais, mentais, individuais e sociais. Esta última é feita na forma de teatro e conduzida por Hayashi, que a batizou de Teatro Social da Presença. Conheça mais assistindo ao vídeo:
Práticas: Decerta forma são as mesmas aplicadas no teatro. Segundo ela, teatro é “o local da expressão de uma história sobre um quadro social”. No teatro, esse quadro social não precisa ser explicado. Basta enxergá-lo. A palavra “presença” refere-se à necessidade de que as pessoas estejam de fato presentes na história: abrir os ouvidos, abrir a intuição e perceber o futuro.
Aplicação:
Primeira fase – Faz-se uma espécie de meditação com o corpo; movimentos para deixar o corpo livre, para experimentar o corpo como ele é, sem nenhum julgamento. Aprende-se nesse processo a pôr toda a atenção no corpo a fim de entendê-lo. Aos poucos vai se vencendo o ruído mental que bloqueia movimentos e a mente e o corpo vão entrando em sintonia.
Segunda fase – Expressar-se com a linguagem corporal. Alguns movimentos representam verbos (estar sentado, estar deitado, estar ajoelhado, estar em pé, estar andando e estar virando). Para cada verbo há um movimento e, com o tempo, é possível construir uma frase inteira só com o uso de movimentos. Os movimentos passam a ser a linguagem e é possível conversar através deles.
Terceira fase – Há um exercício chamado stuck (trava) que usa a linguagem do corpo para pedir ajuda social às outras pessoas. O grupo faz movimentos corporais de libertação para ajudar a pessoa com “problema” a encontrar uma saída para si. Não tem mímica e ninguém emite uma palavra.
Quarta fase – Aplica-se um mapa do sistema social que está em questão e atribui-se alguns papéis (como no teatro) referentes ao problema que se quer solucionar. Por exemplo, para estudar o que se passa com o sistema educacional de uma universidade. Definem-se quem são os stakeholders e todos são convidados a formar o Teatro Social da Presença. Cada um assume o personagem de um stakeholder e diz qualquer frase que vier à cabeça relativa ao papel que vai desempenhar. Feito isso, forma-se um cenário: sem nenhuma palavra, as pessoas buscam um movimento de maior conforto em relação ao que ela está representando e que, em tese, não é sustentável. Esses movimentos vão acontecendo um em relação ao outro. As posições dentro da sala vão criando um novo cenário, que logo traduzirá o que está acontecendo com aquele sistema educacional que se está pesquisando. Há um grupo de observadores. Quando os movimentos se estabilizam, as pessoas dizem uma nova frase sobre o que está sentindo naquele momento. Depois que os “atores” falam, o grupo que assistiu também toma a palavra. Essas falas é que reproduzirão tudo o que está acontecendo naquele universo que se está pesquisando.