Por Amália Safatle
Que o atual modelo de desenvolvimento apresenta falhas profundas, não restam mais dúvidas. A humanidade passou a impor tamanha pressão sobre os recursos do ambiente onde vive que a conta não fecha, ao contrário, a “dívida” só aumenta ano a ano. O ser humano extrai mais do que a Terra consegue repor, e devolve rejeitos em uma quantidade e velocidade que a Terra também não consegue processar.
Não bastasse isso, esse sistema para o qual trabalhamos, além do fato de que não conseguirá prover as necessidades das próximas gerações, não é capaz de gerar bem-estar para a imensa maioria das pessoas já nos dias de hoje. O modelo que nós mesmos alimentamos produz disparidades, injustiças e desequilíbrios na esfera da economia, das relações sociais e do ambiente. Qual é, portanto, o sentido do que fazemos em nossas escolas e no mercado de trabalho? O que estamos ajudando a construir?
Em 1974, em O Mito do Desenvolvimento Econômico, o economista Celso Furtado, já apontava para o irrealismo do modelo utilizado para projetar a economia mundial, dialogando com o estudo The Limits of Growth, desenvolvido pelo MIT para o chamado Clube de Roma.
Foi nesse contexto que há cerca de 40 anos houve um despertar para o tema da sustentabilidade, e a partir daí um questionamento crescente sobre os valores que aprendemos nas escolas e em seguida reproduzimos nas empresas e nos governos.
A formação, portanto, surge na base dessa necessária revisão de modelo. Sem mudar o olhar, o mundo não mudará. É essa mudança de olhar que a Formação para a Sustentabilidade propõe.
Para essa revisão ocorrer, no entanto, é preciso uma nova ética, um novo conjunto de comportamentos. O pensador francês Edgar Morin fala em “ética da educação planetária”, e a define como prioridade máxima para a educação no século XXI.
Na obra Os Sete Saberes Necessários à Educação do Futuro (2011), Morin propõe “conhecer o conhecimento humano; superar a supremacia do conhecimento fragmentado, substituindo-a por um modo de conhecer capaz de apreender os objetos em toda sua complexidade; restituir na educação a capacidade de compreendermos o que significa ser humano; e ensinar a ética, não por meio de lições de moral, mas com base na consciência de que somos, ao mesmo tempo, indivíduo, parte da sociedade, e parte da espécie”.
Se mudar o olhar faz mudar o mundo, o indivíduo coloca-se como o protagonista dessa transformação. Mais ainda que o indivíduo, estamos falando do “ser humano em sua integralidade, dado que o ser humano é, a um só tempo, físico, biológico, psíquico, cultural, social e histórico”, aponta Morin.
Só que essa unidade complexa da natureza humana é totalmente desintegrada na educação por meio das disciplinas, tendo-se tornado impossível aprender o que significa ser humano. “É preciso restaurá-la, de modo que cada um, onde quer que se encontre, tome conhecimento e consciência, ao mesmo tempo, de sua identidade complexa e de sua identidade comum a todos os outros humanos”, diz o pensador.
Nesse movimento de resgate, encontramos alguns pensamentos que podem servir como faróis para essa jornada que tem o interior de nós mesmos como ponto de partida:
“O viajante ainda é aquele que mais importa numa viagem.”
André Suarés
“Digo: o real não está na saída nem na chegada: ele se dispõe para a gente é no meio da travessia.”
Guimarães Rosa
“Conte-me e eu esqueço. Mostre-me e eu apenas lembro. Envolva-me e eu compreendo.”
Confúcio
“O aprendido é aquilo que fica depois que o esquecimento faz o seu trabalho.”
Rubem Alves
“Aprender é antes de tudo estar vivo e portanto essa ação pertence à Vida. Graças à sua capacidade de aprender, o ser humano é capaz de atualizar, ou seja, tornar manifesto (realizar) seu potencial de evolução (…). Nossa aprendência é o motor da emergência do sentido que buscamos.”
Hélène Trocmé-Fabre
“Para ser grande,
sê inteiro;
nada teu exagera ou exclui;
sê todo em cada coisa;
põe quanto és
no mínimo que fazes;
assim em cada lago,
a lua toda brilha
porque alta vive.”
Fernando Pessoa
Estes pensamentos integram o Formação Integrada para a Sustentabilidade: Guia de Fundamentos e Práticas – versão 1.0, produzido pelo FGVces. Acesse a íntegra do guia aqui. E saiba mais sobre o FIS aqui.