Por Fernanda Macedo
Conhecimento é compreender algo por meio da razão e também da experiência. Mudanças de clima têm sido registradas em diversas partes do mundo. Órgãos como o Intergovernmental Panel on Climate Change (IPCC) reúnem estatísticas e, com base nelas, produzem cenários futuros. Mas saber como agir diante essas transformações no presente exige um conhecimento que ainda está em construção.
Para lidar com a mudança do clima, os mais diversos públicos – como comunidades locais e indígenas – desenvolvem técnicas e práticas que não são usualmente registradas pela ciência. Por isso, em diferentes partes do mundo há um conhecimento perdido sobre adaptação à mudança climática, que precisa ser capturado e assimilado.
Mas incluir tantos olhares sobre o tema da adaptação é o sonho de consumo de uma agenda que ainda é nova, em que há bastante espaço para produzir informação de qualidade, compreensível e acessível ao mundo. Sem preencher a lacuna do conhecimento não será possível avançar de forma efetiva, coordenada e planejada.
Opinião de atores-chave
Ao desenvolver o estudo Contribuições para o Planejamento Público em Adaptação (a ser divulgado em breve), para o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), realizado com apoio da Embaixada Britânica, o FGVces entrevistou atores-chave sobre as principais motivações e barreiras para a implementação da agenda da adaptação no País, e sobre o papel do setor público e do privado nesse desafio.
A falta de reconhecimento e conscientização acerca do problema da adaptação, mencionada por 23,8% dos entrevistados, indica barreiras comportamentais ou culturais que impedem ou dificultam ações adaptativas pelo setor industrial, já que o risco climático nem sempre é percebido ou reconhecido como um perigo real. Um dos principais motivos para isso é a desconexão entre as agendas de curto prazo e o timing da adaptação, que lida com prazos indefinidos.
Essa barreira está presente não apenas nas grandes corporações, mas também no setor de médias e pequenas empresas, que desconhecem o problema ou têm maior dificuldade na incorporação do risco climático. Frequentemente nem sequer monitoram os riscos convencionais em seus negócios.
O problema da comunicação fica ainda mais evidente com a menção à falta de informação e dados disponíveis, acessíveis e em formato adequado, citada por 16,7% dos entrevistados no estudo. Esse resultado revela dois principais fatores impeditivos: a informação não está disponível ou está disponível em linguagem ou formato inadequado. Para contornar tal problema, é preciso ajustar a linguagem e traduzir informações de forma mais fácil, útil e prática.
O poder da informação
O Plano Nacional de Adaptação à Mudança do Clima (PNA) menciona a necessidade de criar um conjunto consistente de informações sobre adaptação que possa nortear a processos decisórios. O objetivo do PNA é promover a redução da vulnerabilidade nacional à mudança do clima assim como a gestão do risco associado a esse fenômeno.
A informação de qualidade conduz a tomada de decisão a resultados mais efetivos. Uma decisão tomada em um quarto escuro é apenas um jogo de sorte ou azar. Saber o tamanho do problema e aonde se quer chegar é a melhor estratégia. Por isso, tomadores de decisão tanto do setor público como do privado precisam ter o conhecimento sobre o que é a adaptação e como implementá-la.
Nesse campo, o Estado desempenha uma função central. Muito além dos gastos com infraestrutura para prevenção de desastres, o governo tem o dever de incentivar a adaptação por parte de agentes privados ou locais. Segundo o estudo Recomendações para uma Estratégia Nacional em Adaptação elaborado pelo FGVces, viabilizar a produção e a disseminação de informação sobre alterações climáticas, seus impactos e alternativas de adaptação é uma das principais responsabilidades do governo. A disseminação desse conhecimento para os diversos atores da sociedade é o passo seguinte para assegurar que informações relevantes alcancem de forma tempestiva e organizada os agentes que delas necessitam.
E que informações são essas? Um exemplo seria a criação de sistemas para a coleta de dados de observação e monitoramento do clima. Esses sistemas devem ainda permitir uma análise das informações, indicando a classificação de riscos e eventos climáticos. Plataformas para compartilhamento de informações sobre adaptação também são necessárias nesse processo. E, ainda, considerando que a adaptação já é uma realidade em diversas localidades, o conhecimento local deve ser capturado. Tudo isso, evidentemente, em linguagem adequada e compreensível.
Além de conceitos, cenários e outros dados, o guarda-chuva da informação inclui ações para conscientizar ou capacitar partes interessadas no uso da informação disponibilizada. A parte prática da implementação, como guias, ferramentas e aprendizados, completa o pacote da informação.
Plataforma brasileira
Uma iniciativa em andamento para conectar produtores de conhecimento e quem busca informação relacionada a adaptação é a Plataforma de Conhecimento em Adaptação, cujo lançamento está previsto para o fim de 2017.
Em desenvolvimento pelo FGVces, em parceria com o Ministério do Meio Ambiente e o International Institute for Environment and Development (IIED) e com apoio do Conselho Britânico, a plataforma on-line terá uma governança própria e deverá integrar estudos, relatórios, ferramentas, casos, entre outros materiais em adaptação, organizando e disponibilizando o conhecimento de forma inteligente, de acordo com os perfis dos usuários.
Além disso, faz parte dos objetivos do projeto mapear os atores que produzem conhecimento, especialmente no Brasil e no Reino Unido – uma das referências internacionais no assunto –, mostrar como a adaptação está sendo posta em prática pelo mundo e assinalar o que se pode apreender com essas experiências.
Fora desse ambiente on-line, o projeto compreenderá também atividades de articulação e comunicação, como seminários e estímulo a produção do conhecimento onde forem identificadas lacunas. Que atividades serão essas, quais públicos estarão envolvidos e outras definições serão construídas juntamente com parceiros estratégicos e atores-chave do projeto em workshops e consultas remotas ao longo de 2016 e 2017. Ainda, durante o processo, haverá a publicação de newsletters informando o público mais amplo sobre o andamento do desenvolvimento da Plataforma.
Superada a barreira da informação, o caminho estará livre para a tomada de decisão efetiva, a sobrevivência dos negócios e até mesmo a identificação de oportunidades. Do total de entrevistados no estudo do FGVces, 19,4% citaram como uma das principais motivações para implementar medidas adaptativas aproveitar eventuais oportunidades de negócio. O setor industrial vê, portanto, uma fonte de competitividade na adaptação, a ser explorada por diversos atores da sociedade (leia mais sobre adaptação nas empresas aqui).